quarta-feira, 27 de maio de 2015

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Não à arbitragem de consumo! Novas normas da lei de arbitragem acabam com vitórias de 25 anos de CDC


É preciso dizer não à ‘nova’ lei de arbitragem, que legitima a arbitragem privada de consumo sem limites, até com analfabetos e analfabetos funcionais! O Parlamento aprovou e está para sanção da Presidente Dilma normas de arbitragem que permitem ao árbitro (pago pelas associações de fornecedores!) não seguir as decisões judiciais nas ações coletivas e jogar no lixo todas as vitórias do movimento consumerista desde 1988! Justamente no ano que o CDC completa 25 anos, o Parlamento brasileiro deixa de aprovar o projeto de atualização do CDC e aprova um parágrafo na lei de arbitragem permintindo a arbitragem privada por árbitro único!

Este novo § 3º do art. 4º da Lei 9.307/96 vai permitir – por sua redação ruim e insuficiente – que apartir de agora todos os contratos de consumo tenham cláusulas compromissórias. São cláusulas de arbitragem privada, para que todos os problemas de consumo sejam resolvidos por árbitros únicos, pois afirma a lei: “Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso...”, a significar que o consumidor, se concordar com a arbitragem no contrato, não pode mais ir ao Judiciário! Isso mesmo, o consumidor será convidado a ir a estas arbitragens privadas, seja ele analfabeto, analfabeto funcional, idoso, pobre, entenda ou não de educação financeira, de construção civil etc. E este ‘arbitro’ único (Art. 13) vai dar uma sentença, que é irrecorrível! Pior ainda, os contratos deixarão a cláusula ‘de arbitragem’ na última página e o consumidor vai assinar com mão trêmula a sua sentença de morte!

Na lei aprovada pelo Parlamento brasileiro, os contratos de adesão (assine aqui ao final e aqui -no ‘xizinho’, por favor - afirma o sorridente vendedor!) podem ir a arbitragem e o árbitro nem precisa mais usar o CDC (Art. 2, § 1º),... O árbitro privado pode decidir por ‘equidade’ (art. 2) e por princípios gerais do direito... Bancário (Art. 2, § 1º). A arbitragem privada ainda é sigilosa, não faz jurisprudência e não necessita usar a jurisprudência do STF, STJ e Tribunais. Assim na ‘nova lei’ de arbitragem sequer as normas imperativas do direito brasileiro terão que ser respeitadas. É preciso dizer não a este golpe nos direitos conquistados pelos consumidor: é preciso pedir o veto à Presidente a este novo § 3º do Art. 4º da lei de arbitragem! É preciso dizer não à arbitragem privada de consumo que não fique obrigada a respeitar o CDC e que impeça aos consumidores se beneficiarem das vitórias conseguidas nas ações coletivas (planos econômicos, taxas e garantias na construção civil). É preciso dizer não à arbitragem privada de consumo que libera o árbitro a decidir os casos de consumo como decide os casos entre duas multinacionais, sem usar a jurisprudência e as normas imperativas e de proteção a favor dos consumidores!

É preciso pedir o veto a este § 3º do Art. 4º! A Presidente Dilma tem se mostrado uma pessoa sensível aos direitos dos consumidores e agora terá que nos ajudar ou a luta está perdida... Pessoas analfabetos e hipervulneráveis, sem advogados e defensores públicos, terão uma arbitragem privada e comercial, como na CCI de Paris, só que vivendo na favela! Esperamos que a Presidente possa vetar este lacônico e desastroso § 3º do Art. 4º da nova lei de abritragem! Se o Brasil quer arbitragem de consumo, que seja regulada no Código de Defesa do Consumidor, no processo de atualização do CDC que está em curso. Agora é preciso vetar o § 3º do Art. 4º da nova lei de arbitragem e já!

Claudia Lima Marques, Professora Titular da UFRGS

Flávio Tartuce
Flávio Tartuce
Advogado e consultor em São Paulo. Doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUCSP. Professor do programa de mestrado e doutorado da FADISP. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação da EPD, sendo coordenador dos últimos. Professor da Rede LFG. Autor da Editora...

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Brasil: 12º mais violento do planeta


Brasil: 12º mais violento do planeta 














Se a tolice não fosse também uma característica humana (faz 70 mil anos que o Homo Sapiens aprimorou sua linguagem, com a Revolução Cognitiva, para expressar coisas que não existem, nas quais os humanos acreditam), [1] jamais os demagogos populistas seriam capazes de nos “vender” o mito da segurança grátis.[2] A construção de sociedades razoavelmente civilizadas e seguras exige muito planejamento, políticas preventivas eficientes, excelente escolarização de todos, muitos custos e gastos bem orientados, certeza do castigo e um gigantesco pacto nacional (a segurança é assunto de cada um e de todos nós).

Três modelos de sucesso: 1º) países escandinavos (com 1 assassinato para cada 100 mil pessoas); 2º) EUA (4 para cada 100 mil); 3º) alguns países asiáticos (2 para cada 100 mil). O que esses países de sucesso em matéria de criminalidade nos ensina? Que não se faz omelete sem quebrar ovos. Na economia, o neoliberal Milton Friedman cunhou a famosa frase que diz:“There is no such thing as a free lunch” (não existe esse negócio de almoço grátis).

Em que consiste o mito da segurança grátis? É o que promete distribuir segurança e tranquilidade para todos com a mera edição de uma nova lei ou reforma penal, sem custos para ninguém. O legislador brasileiro de 1940 a 2015 já promoveu 156 reformas penais (das quais, 75% são leis mais duras) e a criminalidade nunca baixou (ao contrário, só aumenta: em 1980 tínhamos 11 assassinatos para cada 100 mil pessoas; fechamos 2013 com 28,2). O legislador não é o único, mas é o grande responsável pela “venda” do “mito da segurança grátis”, que acredita na força (repressiva e preventiva) da alteração legislativa como “solução” para os graves problemas da (in) segurança pública.

Essa política nefasta e infértil (os resultados estão aí para comprovar sua ineficácia) já teria sido extirpada do solo brasileiro se as massas rebeladas (objetivamente indignadas) não caíssem esporádica ou frequentemente na tolice de acreditar no mito da segurança grátis. O Brasil não tem conseguido sair do atoleiro do semi-desenvolvimento (continua na vergonhosa posição 69ª no ranking mundial do IDH – Índice de Desenvolvimento Humano). Um dos termômetros desse sub ou semi-desenvolvimento é a questão da insegurança pública, que é alimentada por uma trágica criminalidade galopante (mais violenta nos criminosos das classes populares e mais corrupta e fraudulenta nos criminosos das classes dominantes).

Existe muita coisa de particularmente errado na formação histórica da sociedade brasileira (permissiva, anômica, não cumpridora das leis etc.), mas nada se compara com as classes dominantes (lideranças extrativistas) que a governa. São sucessivos governos de mau uso do dinheiro público: perdulários, preservadores de privilégios, fisiologistas, patrimonialistas, corruptos etc.

Não é por acaso que o Brasil é o 12º país mais violento do planeta. Esse é o resultado encontrado no levantamento do Instituto Avante Brasil, dentre 185 países, com dados de 2011, 2012 ou 2013 (fontes: UNODC e Ministério da Saúde, Datasus). Entre os 10 mais violentos, 9 estão na América Latina e Caribe, com exceção da África do Sul. São eles: Honduras, na primeira posição por mais um ano (2013: 84,3 mortes para cada 100 mil habitantes), Venezuela (53,6), Belize (45,1), Jamaica (42,9), El Salvador (39,8), Guatemala (34,6), São Cristóvão e Nevis (33,4), África do Sul (31,9), Colômbia (31,8) e Trinidad e Tobago (30,2). Em comum, todos esses países registram alta taxa de desigualdade econômica e social, escandaloso índice de corrupção e baixa escolaridade. O Brasil (em 2013), atrás de Bahamas, registrou uma taxa de mortes de 28,2 por cada grupo de 100 mil habitantes. Em números absolutos, está na primeira posição isolada, com 56.804 homicídios (de acordo com o Datasus).

Os países considerados menos violentos estão em sua maioria na Europa e na Ásia. Liechtenstein e Andorra dividiram a primeira posição com nenhum homicídio nos anos disponíveis. Em seguida vêm Luxemburgo (0,2), Islândia (0,3), Cingapura (0,3), Japão (0,3), Brunei (0,5), Bahrein, Eslovênia (0,5) etc. (são 78 países com mais de 5 assassinatos para cada 100 mil pessoas; 106 com 5 ou menos). Todos esses países se encontram no grupo do IDH elevado ou muito elevado, têm baixo ou médio índice de corrupção, pouca desigualdade econômica e social e bons ou ótimos índices de escolaridade. Os países com até 5 assassinatos para cada 100 mil pessoas possuem essas características; eles comprovam que não existe o mito da segurança grátis. Nos comportamos de forma muito tola quando acreditamos nesse mito.

Veja mais informações sobre este artigo aqui: http://luizflaviogomes.com/brasil-12o-mais-violento-do-planeta/

Colaborou Flávia Mestriner Botelho, socióloga e pesquisadora do Instituto Avante Brasil

Luiz Flávio Gomes
Luiz Flávio Gomes
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas]

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Os retratos falados e o problema das Falsas Memórias



Os retratos falados e o problema das Falsas Memórias




Aqui em Salvador, na Bahia, um fato muito triste aconteceu: uma médica foi estuprada ao sair do seu trabalho.

De todos os crimes eu acho o estupro um dos mais bizarros, violentos, inaceitáveis. No entanto não quero falar do estupro, mas de algo (também!) trágico que aconteceu com toda esta história - que eu espero que tenha um final de feliz: a prisão do verdadeiro culpado.

É que, por meio de um retrato falado, divulgado na mídia, um rapaz veio a público dizer que fora confundido e que, por isto, vem sofrendo. As notícias por aqui na Bahia circulam assim: Homem apontado como autor de estupro a médica presta queixa por difamação.

Segundo ele,

As pessoas me apontam na rua, tenho três dias sem dormir direito, tomando remédio, sem comer, minha vida virou de cabeça pra baixo. Pela Justiça eu estou livre, mas estou sendo acusado pelas pessoas. Minha esposa está me apoiando, estão me expondo e quase não tenho saído de casa.

A Polícia Civil informou que desconhece a origem da foto divulgada nas redes sociais e que não reconhece o homem como suspeito do crime. Ainda de acordo com a Polícia Civil, o delegado responsável pelo caso, Drº William Achan, classificou o acontecimento de "brincadeira de má-fé" e afirmou ainda que o rapaz da foto vai processar os responsáveis pela divulgação da imagem e das informações atribuídas a ele.

De fato, vivemos numa era de extrema violência. Uma era de vingança. Pessoas "de bem" estão cometendo injustiças e atrocidades sob a pretensão de salvar a sociedade do mal.

Qual o problema disso tudo? Os problemas, na verdade:

1- Retrato falado é uma coisa perigosa demais, ainda mais hoje quando estudos avançados de neurociência já falam dos perigos das "falsas memórias". A mulher foi estuprada e vai fazer um retrato falado. A primeira imagem que vem à cabeça, num momento de estresse como este, é a imagem que ela vai jogar pra ser desenhada. Pode ser a imagem de um sonho, uma foto que viu numa revista - e mesmo a imagem de alguém que viu estuprando em um filme.

A dra. Lilian Milnitsky Stein, no livro Falsas Memórias - Fundamentos Científicos e suas Aplicações Clínicas e Jurídicas, diz que

Quando a vítima faz o reconhecimento do suspeito, em vez de acessar a memória verdadeira – aquela primeira, do assalto – a vítima, sem se dar conta, acessa a memória errada. Isso não quer dizer que ela esteja mentindo, porque ela não percebe que esta memória se refere apenas à do retrato falado. Outra situação que pode confundir a vítima é colocar pessoas de biotipos diferentes na hora do reconhecimento.

É claro que não estamos dizendo que a vítima não sabe o que diz, que não devemos confiar. Nada disso! O que estamos querendo dizer é que é preciso tomar cuidado. Como diz Nietzsche: "Não existem fatos, apenas interpretações".

2 - A ajuda do povo nem sempre é bem vinda. Eu considero a Polícia Civil muito boa, capacitada e tal, mas... Divulgar retrato falado é uma prova de como a polícia ainda não tem lá todo este preparo. Cadê o serviço de inteligência para descobrir as coisas, por meio das investigações, sem precisar colocar a população, ávida por vingança, para "ajudar"? Um retrato falado é uma espécie de "é mais ou menos parecido com isto, minha gente", e não deve, nunca, ser considerado como "o real". Em épocas de Whatsapp e Facebook, onde boatos são as novas verdades, divulgar retrato falado e esperar boa coisa é muita ingenuidade.

3 - Não é raro encontrar pessoas parecidas com outras. Certamente alguém já lhe disse ou você já exclamou: “Você parece muito com uma pessoa que eu conheço!”. Um estudo realizado pela Universidade da Carolina do Norte apontou que os rostos das pessoas estão se tornando cada vez mais parecidos. Vejam este site interessantíssimo: Todo el mundo tiene un doble.

Un estudio de la Universidad de Carolina del Norte apunta que los rostros de las personas cada vez se parecen más. Se llegó a esta conclusión tras estudiar más de 200 cráneos españoles y portugueses de los últimos cuatro siglos.

Importantes conclusões:

Um retrato falado é útil, mas

Existe a possibilidade de ao narrar o retrato falado a pessoa estar acessando falsas memórias;
O retrato falado deve servir para a polícia investigar;
Redes Sociais estão se tornando o novo tribunal de Inquisição e onde injustiças, crimes e incentivos para crimes acontecem;
E por fim, mas não menos importante, é preciso tomar cuidado com as aparências, pois elas enganam e um dia você pode ser confundido com outro alguém e sofrer as dores de ter que provar que não fez o que dizem que você fez e, depois de provar inocência, viver com as duras marcas dos estragos feitos.
Sejamos mais responsáveis, porque digamos que alguém se pareça realmente com a pessoa de uma foto: parecer não é ser, sendo assim "in dubio pro reo".

Wagner Francesco
Wagner Francesco
teólogo e acadêmico de Direito.

Nascido no interior da Bahia, Conceição do Coité, formado em teologia e estudante de Direito. Pesquiso nas áreas do Direito Penal e Processo Penal. Página no Facebook: facebook.com/wagnerfrancesco.jus

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http://wagnerfrancesco.jusbrasil.com.br/artigos/190271676/os-retratos-falados-e-o-problema-das-falsas-memorias?utm_campaign=newsletter-daily_20150522_1209&utm_medium=email&utm_source=newsletter

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Seção uniformiza entendimento sobre sucessão em regime de comunhão parcial de bens



Seção uniformiza entendimento sobre sucessão em regime de comunhão parcial de bens


O cônjuge sobrevivente, casado sob o regime da comunhão parcial de bens, concorre com os descendentes na sucessão do falecido apenas quanto aos bens particulares que este houver deixado, se existirem. Esse é o entendimento da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em julgamento de recurso que discutiu a interpretação da parte final do inciso I do artigo 1.829 do Código Civil de 2002.

A decisão confirma o Enunciado 270 da III Jornada de Direito Civil, organizada pelo Conselho da Justiça Federal (CJF), e pacifica o entendimento entre a Terceira e a Quarta Turma, que julgam matéria dessa natureza.

O enunciado afirma que “o artigo 1.829, I, do CC/02 só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) serem partilhados exclusivamente entre os descendentes".

Segundo o ministro Raul Araújo, que ficou responsável por lavrar o acórdão, o CC/02 modificou a ordem de vocação hereditária, incluindo o cônjuge como herdeiro necessário, passando a concorrer em igualdade de condições com os descendentes do falecido.

Embora haja essa prerrogativa, a melhor interpretação da parte final desse artigo, segundo o ministro, no que tange ao regime de comunhão parcial de bens, não pode resultar em situação de descompasso com a que teria o mesmo cônjuge sobrevivente na ausência de bens particulares do falecido.

Controvérsia

O artigo 1.829, I, do Código Civil dispõe que a sucessão legítima defere-se em uma ordem na qual os descendentes concorrem com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (artigo 1.640, parágrafo único), ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.

A questão que gerou divergência entre os ministros foi a interpretação da parte final desse artigo, na identificação dos bens em relação aos quais o cônjuge sobrevivente, na qualidade de herdeiro necessário, concorrerá com os descendentes, quando adotado o regime de comunhão parcial de bens.

A controvérsia era saber se a concorrência incidiria sobre todo o conjunto dos bens deixados pelo falecido, chamado de herança; apenas sobre aqueles adquiridos onerosamente na constância do casamento, excluída a meação do cônjuge sobrevivente, a exemplo do que ocorre na sucessão do companheiro (artigo 1.790); ou apenas sobre os bens adquiridos antes do casamento, os quais a lei chama de particulares.

Bens particulares

O relator original do recurso no STJ, ministro Sidnei Beneti (hoje aposentado), apresentou a tese que saiu vencedora na Segunda Seção. Ele entendeu que a concorrência somente se dá em relação a bens particulares, ou seja, em relação àqueles que já integravam o patrimônio exclusivo do cônjuge ao tempo do casamento.

A ministra Nancy Andrighi divergiu desse entendimento. Para ela, o cônjuge sobrevivente, a par de seu direito à meação, concorreria na herança apenas quanto aos bens comuns, havendo ou não bens particulares, que deveriam ser partilhados unicamente entre os descendentes.

No caso analisado, o autor da ação iniciou relacionamento de união estável em 1981. Em 1988, casou sob o regime de comunhão parcial de bens, quando a mulher já era proprietária de um terreno. Ao longo de 12 anos após o casamento, foi construído no terreno um prédio residencial, com recursos do autor, no montante de R$ 78,6 mil. A mulher faleceu em 2008, e o viúvo ajuizou ação para ser reconhecido como proprietário do imóvel, total ou parcialmente.

Os filhos da falecida sustentaram que o imóvel não se comunicava com o cônjuge, pois se trata de bem adquirido anteriormente ao casamento. O Tribunal de Justiça de São Paulo concordou com a tese defendida pelos filhos, mas a Segunda Seção do STJ deu provimento ao recurso do viúvo, que tem mais de 80 anos, reconhecendo o seu direito à meação e à participação como herdeiro necessário dos bens particulares.

Superior Tribunal de Justiça
Superior Tribunal de Justiça

Criado pela Constituição Federal de 1988, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) é a corte responsável por uniformizar a interpretação da lei federal em todo o Brasil, seguindo os princípios constitucionais e a garantia e defesa do Estado de Direito.

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http://stj.jusbrasil.com.br/noticias/191387641/secao-uniformiza-entendimento-sobre-sucessao-em-regime-de-comunhao-parcial-de-bens?utm_campaign=newsletter-daily_20150527_1224&utm_medium=email&utm_source=newsletter

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A (i)legalidade de sites que divulgam dados pessoais


A (i)legalidade de sites que divulgam dados pessoais



Recentemente, o site “Nomes Brasil” permitiu a consulta do CPF e outros dados de uma grande parte da população brasileira. Não havia nenhuma restrição de acesso ou limitação de conteúdo. Bastava digitar o nome e verificar se os dados constavam na base de dados online. A página foi retirada do ar pelos provedores de hospedagem após notificação da Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC). O órgão considerou indevida a veiculação de tais dados sem o conhecimento e a autorização dos seus titulares, e baseou seu entendimento no Código de Defesa do Consumidor e no Marco Civil da Internet. Mas será que estas leis realmente vedam a veiculação destes dados?

Antes de mais nada, é importante esclarecer que, sim, a publicidade de dados pessoais e outras informações particulares da forma como foram expostas no site “Nomes Brasil” é indevida, com base, simplesmente, no direito fundamental à privacidade previsto na Constituição Federal de 1988.

Todavia, a questão demanda uma análise contextual, com base, principalmente no potencial risco de uso das informações constante do site para fins de fraude e eventuais danos aos seus titulares.

O Código Civil estabelece em seu Art. 12 que “pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade (...)”. O direito à privacidade engloba diversos outros relacionados à personalidade, como o direito à intimidade, honra e imagem. Desta forma, uma vez que a veiculação não autorizada de dados pessoas potencialmente permite a má utilização destes para práticas como a criação de identidades falsas, pode o titular exigir que referida publicidade cesse, e inclusive se valer do judiciário para tanto, se necessário.

Somado a isso, um ponto importante quanto à possível ilicitude é o previsto no artigo 43 do CDC, que trata sobre bancos de dados consumeristas, pois não é de conhecimento público a origem dos dados veiculados na página e se houve comunicação ao consumidor quando da inserção dos seus dados em um banco estruturado. Dispõe o artigo 43 do CDC que é imprescindível a comunicação do usuário quando da abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais, conforme § 2º do mesmo artigo, verbis:

“Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.

(...)

§ 2º A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.”

O Prof. Rizzato Nunes explica que essa previsão foi feita em razão do disposto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, visando a proteção da privacidade do consumidor:

“muito embora a ênfase e a discussão em torno das regras instituídas no art. 43 recaiam nos chamados cadastro de inadimplentes dos serviços de proteção ao crédito, a norma incide em sistemas de informação mais amplo. Todo e qualquer banco de dados de arquivo de informações a respeito de consumidores – pessoas físicas ou jurídicas – está submetido às normas do CDC. (...) A norma do § 2º é expressa e clara, não deixando margem de dúvida: “a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele”. É garantia que decorre diretamente do texto constitucional de preservação de privacidade do consumidor (art. 5º, X, da CF). Vale tanto para a abertura de cadastros ditos positivos quanto negativos.”

O art. 43 do CDC determina que o consumidor deve apenas ser informado - e não necessariamente autorizar - quando da criação e/ou inserção de seus dados em uma base de dados. Não existiria na lei vedação expressa a transferência dessa base de dados ou a sua utilização por terceiros. No caso do site sob comento, o usuário pode, eventualmente, ter sido informado da inserção dos seus dados na base de dados original e esta ter sido adquirida pelo responsável pelo site, que estaria possivelmente utilizando-a sem violar expressamente o Código Consumerista. Todavia, o CDC não pode ser interpretado isoladamente.

A portaria nº 5/2002, da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, que complementou o elenco de cláusulas abusivas constantes do art. 51 do CDC, considerou abusiva qualquer disposição que:

I - autorize o envio do nome do consumidor, e/ou seus garantes, a bancos de dados e cadastros de consumidores, sem comprovada notificação prévia

II - imponha ao consumidor, nos contratos de adesão, a obrigação de manifestar-se contra a transferência, onerosa ou não, para terceiros, dos dados cadastrais confiados ao fornecedor

III - autorize o fornecedor a investigar a vida privada do consumidor

O que a portaria, na prática, implementa, é o instituto do consentimento. Não basta o consumidor ser informado que seus dados serão inseridos em uma base de dados, como determina o art. 43. É necessária a sua autorização para que seus dados sejam transferidos para terceiros. No contexto sob exame, mesmo se a página “Nomes Brasil” esteja utilizando uma base de dados adquirida legitimamente, esta transferência teria que ser autorizada pelos titulares dos dados consumeristas. Portanto, é possível inferir que o fato de muitas pessoas terem ficado surpresas e chocadas ao verificarem que seus dados estavam disponíveis para qualquer um que os procurasse demonstra que não houve consentimento.

Quando a esfera da administração pública, que originalmente confere os CPFs aos seus titulares, esta requer exigências mais rígidas do que a esfera das relações meramente privadas, com base no mandamento constitucional do art. 37 da CF/88. A administração pública é adstrita ao previsto em lei. A esfera privada pode fazer o que não estiver vedado por lei.

Nesse contexto, o site da Receita Federal traça o procedimento que entidades públicas devem seguir para a disponibilização de dados, havendo inclusive Instruções Normativas expressamente tratando sobre isso. Destaco os trechos mais relevantes:

IN Nº 19

Art. 1o Esta Instrução Normativa disciplina os procedimentos de fornecimento de dados cadastrais e econômico-fiscais da Secretaria da Receita Federal - SRF, a outras entidades.

Art. 2o O atendimento a solicitações de fornecimento de dados cadastrais da SRF, efetuadas por outras entidades, será executado pela Coordenação-Geral de Tecnologia e de Sistemas de Informação - COTEC, ou por suas projeções regionais ou locais.

§ 1o O fornecimento de dados fica limitado àqueles constantes de cadastro de domínio público e que não informem a situação econômica ou financeira dos contribuintes.

§ 2o Consideram-se de domínio público os dados das pessoas físicas ou jurídicas, que, por força de lei, devam ser submetidos a registro público.

Art. 4o O fornecimento de dados a instituição de direito privado somente será efetivado quando a informação for indispensável, em virtude de lei, ao exercício de suas atividades.

IN Nº 20

Art. 8o O fornecimento eventual com acesso on line às bases de dados somente poderá ser realizado por intermédio da COTEC ou DITEC/SRRF.

Art. 9o O fornecimento continuado com acesso on line às bases de dados será efetuado mediante credenciamento de usuários do órgão ou da entidade interessados no Sistema de Entrada e Habilitação - SENHA, da SRF, observado para este fim o disposto na Portaria SRF No 782, de 20 de junho de 1997.

Parágrafo único. O acesso às bases de dados da SRF, na forma deste artigo, fica condicionado à reciprocidade de tratamento em relação às bases de dados fiscais do órgão convenente, salvo se a SRF abdicar expressamente dessa prerrogativa.

Com base nisso, analisando o que consta do site da própria Receita, seria possível construir a tese de que essas informações não são públicas:

50. EXISTE A POSSIBILIDADE DE PESQUISAR O NÚMERO DO CPF, ATRAVÉS DO SITIO DA RECEITA FEDERAL?

Não. Tente localizar o número em algum outro documento, cheque, contrato, etc. Se não conseguir, pode-se obter o número do CPF em uma unidade de atendimento da Receita Federal do Brasil.

Todavia, as instruções normativas dizem respeito ao acesso aos dados cadastrais e econômico-fiscais presentes nos bancos de dados da Receita Federal. Ou seja, um acesso direto aos bancos de dados ou a transferência destes dados, por parte da Receita, para entidades privadas. Os dados cadastrais e econômico-fiscais como o CPF podem também ser obtidos de outras fontes, como diretamente de uma empresa privada, de sistemas de busca na Internet, ou mesmo de um camelô na Santa Efigênia. Salvo maior juízo, estes bancos de dados não estariam sujeitos às instruções normativas mencionadas acima.

Portanto, é possível afirmar que os dados de CPF e outros afins são, sim, dados públicos. Todavia, existe a diferença entre o que é público e o que publicamente acessível por qualquer pessoa. Por exemplo, até pouco tempo, os salários de funcionários públicos não podiam ser publicados em sites governamentais, inobstante serem dados públicos. Agora estes são públicos e publicamente acessíveis (ou pelo menos deveriam ser). Entretanto, dados públicos também podem ter natureza pessoal, o que deve conferir aos seus titulares controle sobre a sua divulgação e coleta, caso não haja previsão em lei determinando a publicidade.

O CPF é um dado pessoal público que confere ao seu titular o direito a controlar a sua divulgação caso o contexto possa violar, entre outros, o seu direito à privacidade ou ameaçar algum outro direito, como eventual dano econômico oriundo, e. G., da criação de uma identidade falsa. Todavia, nem a CF/88, nem o CDC, nem o Código Civil e o Marco Civil da Internet conferem ao cidadão todas as ferramentas necessárias para o controle dos seus dados pessoais. Por isso que atualmente se discute o Anteprojeto de Proteção de Dados Pessoais.


Referido Anteprojeto visa discutir regulação que pretende estabelecer um regime legal abrangente de proteção de dados pessoais. Esta norma pretende conferir ao cidadão meios para controlar efetivamente o que é feito com seus dados pessoais, ao mesmo tempo que estabelece parâmetros jurídicos seguros para o processamento de dados pessoais, base da economia digital em que vivemos atualmente. Caso referida legislação já estivesse em vigor, em tese, os titulares de dados teriam formas efetivas de combater e evitar que seus dados pessoais, como os expostos pelo “Nomes Brasil”, sejam utilizados de forma indevida e não autorizada. Situações como estas e muitas outras devem servir de incentivo para continuarmos discutindo ativamente o futuro da proteção de dados pessoais no Brasil.


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http://renatoleite.jusbrasil.com.br/artigos/191596216/a-i-legalidade-de-sites-que-divulgam-dados-pessoais?utm_campaign=newsletter-daily_20150527_1224&utm_medium=email&utm_source=newsletter

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quinta-feira, 14 de maio de 2015

Condenação a pai que buscou anular registro de filha afetiva após 12 anos


Condenação a pai que buscou anular registro de filha afetiva após 12 anos




A 1ª Câmara Civil do TJ manteve decisão que negou pedido de anulação de registro civil formulado por um pai após 12 anos de convivência com filha afetiva. Mais que isso, a Justiça determinou que o homem banque indenização por danos morais em favor da criança, no valor de R$ 50 mil. O insurgente alegou em seu recurso que foi coagido e que houve erro essencial no ato do registro civil, porém não apresentou nenhuma prova nesse sentido.

A manutenção da paternidade socioafetiva foi confirmada, também, porque o autor manteve contato com a criança mesmo após separar-se da companheira e mãe da menina - ele deteve a guarda exclusiva sobre a filha por mais sete anos. A câmara vislumbrou afeto verdadeiro a preponderar sobre o fim do vínculo, além de considerar essa a melhor solução para a menina. A conduta do recorrente foi tomada como descaso e abandono afetivo em relação à filha, o que configura, sim, ato ilícito e gera o dever de indenizar a criança, representada por sua mãe.


A filha alegou que, ao tomar conhecimento da vontade do pai, passou a ser tratada com desprezo e discriminação pelo fato de ser obesa, o que não fechava com os ideais de beleza dele e só fazia aumentar as humilhações. Dessa forma, a guarda foi transferida para a mãe. O drama gerou abalo psíquico pelo abandono total e pelo corte radical do amor que a menina nutria pela figura paterna.

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Rejeitada denúncia de tentativa de furto de um pedaço de carne avaliado em R$22,30, em Blumenau


Rejeitada denúncia de tentativa de furto de um pedaço de carne avaliado em R$22,30, em Blumenau







O Juiz de Direito Juliano Rafael Bogo, da comarca de Blumenau, Santa Catarina, rejeitou a denúncia ofertada pelo Ministério Público de Santa Catarina que buscava responsabilizar criminalmente o sujeito que tentou furtar um pedaço de carne, tipo alcatra, avaliado em R$ 22,30. O magistrado reconheceu a irrelevância penal da imputação, sublinhando os custos da persecução de fatos insignificantes do ponto de vista penal. O Empório do Direito recomenda a leitura da decisão, transcrita abaixo.

Autos nº 0020617-31.2011.8.24.0008

Ação: Ação Penal – Procedimento Ordinário/PROC

Autor: Ministério Público do Estado de Santa Catarina

Acusado: M. De A.

Vistos etc.

I – Relatório:

Ministério Público do Estado de Santa Catarina denunciou M. De A., acusando-o de ter praticado o crime previsto no art. 155, § 2º, c/c art. 14, inciso II, do CP, por ter subtraído para si, no dia 25 de agosto de 2011, uma peça de carne tipo alcatra, avaliada em R$22,30 (vinte e dois reais e trinta centavos), do Supermercado Bistek, não conseguindo consumar a infração por circunstâncias alheias a sua vontade, conforme fatos e circunstâncias narrados na denúncia de fl. II.

Inicialmente, o réu aceitou a suspensão condicional do processo.

Após, a benesse foi revogada, retomando-se o andamento da ação penal.

Citado, o réu apresentou resposta escrita, postergando pronunciamento sobre o mérito após a devida instrução do feito.

Em audiência foram produzidas as provas, após o que as partes apresentaram suas alegações finais. O Ministério Público requereu a condenação do réu, nos termos da denúncia. A defesa, por sua vez, sustentou que deve ser aplicado ao caso o princípio da insignificância; que não há provas suficientes para condenação e, subsidiariamente, no caso de condenação, seja reconhecida a atenuante de confissão espontânea.

II – Fundamentação:

Aqui se verifica que o Estado, por meio das agências encarregadas da persecução penal, busca apurar os fatos e obter a condenação de uma pessoa por ter tentado subtrair um pedaço de carne (alcatra) de um grande supermercado. O sujeito foi flagrado pelos seguranças do estabelecimento. O produto foi apreendido e, de plano, restituído ao supermercado. Depois, coube ao Estado a tarefa de, sob a justificativa de que o patrimônio é um bem jurídico a ser protegido, por meio do direito penal, instaurar um inquérito e um processo judicial contra o acusado, ainda que se soubesse, de antemão, que o custo de tudo isso seria infinitamente superior ao prejuízo que a vítima possa ter sofrido (se é que prejuízo houve).

Lamentavelmente, muitos operadores jurídicos vivem na ilusão de que o Poder Judiciário possui capacidade de absorver e dar uma resposta a todo e qualquer conflito surgido na sociedade.

Isto é, numa atividade nitidamente mecânica, sem a necessária visão crítica, esquece-se que enquanto o Poder Judiciário é chamado a tratar de pequenos delitos, que nenhuma relevância possuem, como um furto de uma porção de alcatra, outras inúmeras ações penais versando sobre crimes de média e alta gravidade ficam para trás, sem a resposta penal tempestiva e adequada, ou são levadas ao insucesso pela superveniência da prescrição.

Alexandre Morais da Rosa abordou o tema em artigo publicado no Conjur (aqui):

“A Tragédia dos Comuns é um tipo de armadilha social de fundo econômico que envolve o paradoxo entre os interesses individuais ilimitados e o uso de recursos finitos. Por ela, se declara que o livre acesso e a demanda irrestrita de um recurso finito (Jurisdição) terminam por condenar estruturalmente o recurso por conta de sua superexploração. Em face dos limitados recursos do Poder Judiciário e de sua capacidade de assimilação, a propositura de ações abusivas, frívolas ou de cunho meramente patrimonial (bagatela, insignificantes), sem custo, pode gerar o excesso de litigância (abusivo ou frívolo). O custo de um processo é assimilado pela coletividade e pelos demais usuários na forma de uma externalidade negativa, ou seja, os processos que deveriam ser julgados não podem, pela acumulação de ações inautênticas[3]. Por isso, Júlio Marcellino Jr[4] aponta:

“O modelo tradicional de acesso à Justiça, seja em sua versão clássica ainda defendida por muitos, seja em sua versão atual baseada no modelo gerencial e de eficiência, ainda se mostra precária e insuficiente para dar conta de toda a demanda de ações judiciais. Em outras palavras, entende-se que tal modelo ainda não alcançou, apesar dos significativos avanços, efetividade em nível razoável. Isto porque há uma evidente saturação da capacidade de resposta do Judiciário. Há uma parcela da demanda judicial, e que representa muito em termos de volume, de ações propostas em caso de litigância frívola, ações repetitivas, e litigantes habituais. Entende-se, e defende-se como questão central a partir deste estudo, que nesses casos, de baixa probabilidade de êxito em demandas ou na hipótese de demandas repetitivas, há um flagrante abuso de direito de ação.”

É claro que os viciados em punição e que apostam suas fichas no Direito Penal, num país com a terceira posição no ranking mundial de segregados, pensam que se prende pouco. Esses deveriam entender que o Direito Penal não pode dar mais do que se pede a ele, ou seja, o Direito Penal sempre chega atrasado e não possui os efeitos que promete.“

Adotando-se uma visão minimalista do direito penal (necessária num Estado Democrático de Direito), e considerando a incapacidade do Poder Judiciário de dar resposta a todo e qualquer conflito surgido no meio social, é inarredável que se faça uma filtragem nas ações penais, para que questões singelas e sem importância não obstem o trato de casos efetivamente relevantes.

Ou seja, não se pode admitir a instauração de um processo penal para tratar de fato irrelevante para a sociedade, em comparação com inúmeros crimes de média e alta gravidade pendentes de apuração e julgamento, sob pena de restar inviabilizada a resposta estatal para esses delitos que efetivamente afligem o meio social.

Por outro lado, não se pode perder de vista que a criminalização primária (legislador) e secundária (instâncias encarregadas da persecução penal) está sujeita a limites estabelecidos pelos princípios da intervenção mínima e da lesividade, bem como pelos direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição.

Não se pode criminalizar toda e qualquer conduta reprovável do ponto de vista moral, sem que haja relevante ofensa a um bem jurídico. Igualmente, não se pode impor uma sanção penal sem que a conduta do réu tenha causado significativa lesão a um bem jurídico protegido. Ou seja, o Direito Penal opera de forma fragmentária, tendo sempre como referência o princípio da lesividade (cf. LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 9. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 380).

Juarez Cirino dos Santos ensina:

“O princípio da lesividade proíbe a cominação, a aplicação e a execução de penas e de medidas de segurança em casos de lesões irrelevantes contra bens jurídicos protegidos na lei penal, porque considera o bem jurídico do ponto de vista qualitativa (natureza do bem jurídico) e do ponto de vista quantitativo (extensão da lesão do bem jurídico). 1. Do ponto de vista qualitativo (natureza do bem jurídico), o princípio da lesividade impede a criminalização primária e secundária excludente ou redutora das liberdades constitucionais de pensamento, de consciência e de crença, de convicções filosóficas e políticas ou de expressão da atividade intelectual, artística, científica ou de comunicação, garantidas pela Constituição acima de qualquer restrição da legislação penal. 2. Do ponto de vista quantitativo (extensão da lesão do bem jurídico), o princípio da lesividade exclui a criminalização primária ou secundária de lesões irrelevantes a bens jurídicos. Nessa medida, o princípio da lesividade é a dimensão positiva do princípio da insignificância em Direito Penal: lesões insignificantes de bens jurídicos protegidos, como a integridade ou saúde corporal, a honra, a liberdade, a propriedade, a sexualidade etc, não constituem crime” (SANTOS, Juarez Cirino dos. Manual de direito penal. 2 ed. Florianópolis: Conceito, 2012. P. 14-15).

Sobre a tipicidade, leciona Rogério Greco:

[…] tipicidade significa “a subsunção perfeita da conduta praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na lei penal, isto é, a um tipo penal incriminador […]. A adequação da conduta do agente ao modelo abstrato previsto na lei penal (tipo) faz surgir a tipicidade formal ou legal. Essa adequação deve ser perfeita, pois, caso contrário, o fato será considerado formalmente atípico. […] Entretanto, esse conceito de simples acomodação do comportamento do agente ao tipo não é suficiente para que possamos concluir pela tipicidade penal, uma vez que esta é formada pela conjugação da tipicidade formal (ou legal) com a tipicidade conglobante. […] A tipicidade conglobante surge quando comprovado, no caso concreto, que a conduta praticada pelo agente é considerada antinormativa, isto é, contrária à norma penal, e não imposta ou fomentada por esta, bem como ofensiva a bens de relevo para o Direito Penal (tipicidade material). […] Sabemos que a finalidade do Direito Penal é a proteção dos bens mais importantes existentes na sociedade. O princípio da intervenção mínima, que serve de norte para o legislador na escolha dos bens a serem protegidos pelo Direito Penal, assevera que nem todo e qualquer bem é passível de ser por ele protegido, mas somente aqueles que gozem de certa importância. Nessa seleção de bens, o legislador abrigou, a fim de serem tutelados pelo Direito Penal, a vida, a integridade física, o patrimônio, a honra, a liberdade sexual etc. Embora tenha feito a seleção dos bens que, por meio de um critério político, reputou como os de maior importância, não podia o legislador, quando da elaboração dos tipos penais incriminadores, descer a detalhes, cabendo ao intérprete delimitar o âmbito de sua abrangência. […] Assim, pelo critério da tipicidade material é que se afere a improtância so bem no caso concreto, a fim de que possamos concluir se aquele bem específico merece ou não ser protegido pelo Direito Penal” (Curso de Direito penal: parte geral. 16. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014. P. 164-168).

Na espécie, trata-se de uma tentativa de furto de um pedaço de carne, do tipo alcatra, avaliado em R$ 22,30, o que representa menos de 30% de um salário mínimo, valor tido por irrisório (toma-se por referência decisão do STJ noAgRg no REsp 1376290/RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, 5ª Turma, julgado em 10/06/2014, DJe 18/06/2014). Ademais, o bem foi imediatamente recuperado pela vítima, a qual, portanto, não sofreu prejuízo financeiro. Destarte, mostra-se claramente irrelevante a lesão ao bem jurídico tutelado, inexistindo tipicidade material. Portanto, não há crime.

III – Dispositivo:

Ante o exposto, julga-se improcedente a denúncia, para absolver M. De A., nos termos do art. 386, III, do CPP.

Sem custas.

P. R. I.

Após o trânsito em julgado, arquive-se o processo.

Blumenau (SC), 13 de maio de 2015.

Juliano Rafael Bogo


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